É muito comum o comentário sobre “barreiras invisíveis nas organizações” – fatores que, apesar de não serem físicos como paredes e móveis, têm o poder de impedir que iniciativas se concretizem. Em geral essas barreiras provêm de rivalidade entre áreas, medo de errar, uma cultura hostil a feedbacks a superiores, etc.
Esse é um problema tão comum, tão universal, que a Table Partners e outras consultorias temos metodologias para endereçar e remover essas “barreiras invisíveis”. É um exercício intenso, que demanda muita energia e pensamento dos executivos, mas é muito gratificante e eficaz.
Mas quão “invisíveis” são, de fato, essas barreiras?
O oculto e o invisível
Não muito. As pessoas conhecem e comentam as barreiras da empresa a portas fechadas.
No fundo, o time de liderança não tem (e nós criamos) a oportunidade – o contexto seguro – para falar aberta e construtivamente sobre essas barrreiras.
As barreiras organizacionais não são “invisíveis”, elas só são ocultas – escondidas embaixo do tapete.
O monstro no porão
Abaixo do tapete, entretanto, às vezes há um porão. E, no porão, às vezes há forças bem mais “invisíveis” e bem mais poderosas do que as tais “barreiras”.
Frequentemente, em nossos projetos de planejamento, um pequeno número de iniciativas acaba não sendo executado, sem razões aparentes. A maior parte das iniciativas, mesmo as mais complexas, é implementada com sucesso, mas algumas não ganham tração nem atenção gerencial. Prazos são perdidos sem que ninguém se manifeste.
Será que essas iniciativas se tornaram irrelevantes, durante a implementação da estratégia?
Considere o seguinte case, de decisão estratégica naufragada por um iceberg invisível.
O patinho feio
A NobleChem é respeitada, em seu mercado, pelo desenvolvimento do tradicional produto químico Tomax. Há seis anos, um concorrente introduziu um produto mais simples, moderno e barato e, gradualmente, conquistou a liderança do mercado.
Este concorrente não apenas roubou share da NobleChem, mas aumentou o mercado, atraindo segmentos low-end que a NobleChem nunca atendeu.
Há cerca de quatro anos, a NobleChem reagiu ao ataque lançando o Novax, um produto mais barato, com a mesma tecnologia do concorrente e voltado para os segmentos low-end.
O Novax cumpriu sua missão: estancou o avanço do concorrente e, hoje, vende bem mais do que o Tomax. As vendas somadas de Tomax e Novax, contudo, ainda são inferiores às do concorrente.
Estranhamente, quase toda a energia da empresa continua dirigida ao Tomax. O produto “nobre” recebe a maior verba de marketing; tem uma equipe comercial maior do que a do Novax e, em reuniões de diretoria, quase não se discute o carro-chefe da empresa, o Novax. Nenhum executivo é responsável individualmente pelo resultado do Novax.
Vamos mudar
A Table Partners apoiou a NobleChem na formulação de uma estratégia e plano de ações para 5 anos.
Ao longo do projeto, debates intensos e acalorados deram aos executivos clareza de que precisavam aumentar o foco e os recursos alocados ao Novax. O produto era visto, agora, como o caminho para a reconquista da liderança.
Ou não…
Dois meses depois, uma surpresa: a direção da NobleChem decide, contradizendo seu próprio plano estratégico, baratear a formulação do Novax, piorando o produto – sem reduzir seu preço – para compensar a perda de resultados do Tomax.
Desde então, a concorrência ganhou ainda mais share de mercado, enquanto os líderes da NobleChem continuam administrando o Novax como um provedor de recursos para financiar esforços, infrutíferos, de devolver o Tomax a seus dias de glória.
O que aconteceu aqui? Por que o mesmo grupo de líderes que documentou e mobilizou sua organização com uma linha de ação aborta-a em tão curto espaço de tempo?
O poder do invisível
A história pessoal dos acionistas e de vários dos executivos pode ser parte da explicação. Seu prestígio no mercado decorre do prestígio do Tomax. Desapegar-se do produto talvez seja, para eles, um desafio de natureza pessoal, envolvendo aspectos de auto-estima e ego.
Sejam quais forem as barreiras que impediram estes executivos de implementar sua decisão, elas são certamente “mais invisíveis” do que as tradicionais barreiras de rivalidade entre áreas, resistência a mudança, etc. Elas são tão invisíveis que os próprios envolvidos – ao contrário das barreiras tradicionais – não são capazes de percebê-las e discuti-las, mesmo quando isso pode determinar o sucesso ou insucesso de suas organizações.
Pergunta: se você fosse consultor, como lidaria com o comportamento inesperado da NobleChem? Você já testemunhou uma situação parecida?