Há 20 anos atrás eu perdi uma aposta para a jornalista e editora Fátima Ali, então executiva do Grupo Abril, encarregada de pôr no ar a MTV brasileira.
Eu, redondamente equivocado, apostei que a revista Caras não emplacaria no Brasil.
Fátima me explicou porque tinha certeza que a revista teria muito sucesso:
“As pessoas não querem mais saber como um especialista em passarinhos recomenda que elas criem seus passarinhos. Elas querem saber como o Tom Jobim ou o galã da novela criam seus passarinhos. Cada vez mais o jornalismo dará a informação pela ótica das pessoas que o público eleger como referência – das celebridades”.
Infotainment
De lá para cá muitos passarinhos devem ter morrido, mas as mídias que seguiram a receita profética de Fátima Ali acertaram em cheio! Hoje, informação e entretenimento estão quase se amalgamando em um único conteúdo.
A Internet é a expressão máxima e o veículo por vocação dessa tendência, mas todas as outras mídias seguem a mesma trajetória. Os únicos jornais cuja circulação cresce, no mundo (e em São Paulo também) são os gratuitos, como o Metro, que oferecem um conteúdo “Internet impressa”.
Mesmo a informação mais “séria”, como a do noticiário das oito, vem progressivamente adquirindo um sabor de entretenimento. O Jornal Nacional aloca uma fração cada vez maior de seu tempo a matérias seriadas, de formato “revista” (diga-se de passagem, mais caras de produzir).
Os observadores e analistas da mídia chamam este conteúdo de “infotainement“, uma combinação de informação e entretenimento.
Utilitainment
Assim como na mídia, também na área de tecnologia o entretenimento e a informação estão convergindo.
O surgimento de devices como iPhone/Pod/Pad, em que conteúdos de mídia e tecnologia podem ser indistintamente consumidos, viabilizou o “utilitainment”: o aplicativo que serve a uma utilidade, mas cujo principal atrativo é seu valor como entretenimento.
É possível que, no futuro, o infotainment seja apenas um tipo de utilitainment. Afinal informação é apenas uma das utilidades que o meio digital pode entregar.
Dos 4 bilhões de dowloads da App Store da Apple (número que cresce 1 bilhão a cada 90 dias), a segunda categoria mais vendida (18%) é Entretenimento (a primeira, disparada, é Games, com 58%).
Durma-se com isso

Os gráficos cool do Sleep Cycle: utilitainment para saúde
Mas mesmo aplicativos fora da categoria Entretenimento podem ser entendidos como utilitainment.
Um bom exemplo é o Sleep Cycle, desenvolvido pelo Lexwarelabs para o iPhone. Você coloca o celular embaixo do seu travesseiro e o aplicativo desenha um gráfico e calcula indicadores de qualidade de sua noite de sono.
Claramente esse é um aplicativo para saúde mas, convenhamos, por que alguém que não sofra de apnéia crônica compraria (US$0,99) esse aplicativo, se ele não fosse cool, interessante e seus amigos estivessem comentando a respeito?
O Sleep Cycle atingiu o primeiro lugar em downloads da App Store na Alemanha, Japão, Russia, Holanda, Coréia, Suécia, Finlândia, Dinamarca, Hong-Kong, Polônia e Tailândia.
That’s utilitainment!