Os mercados de capital humano enfrentam dois desafios para tornarem-se mais eficientes.
Em primeiro lugar, a maioria das capacidades individuais são difíceis de caracterizar, dificultando transações. O dinheiro é, por definição, fungível; as capacidades humanas não são.
Em segundo lugar, será necessário substituir formas tradicionais de emprego por relações de trabalho autônomas (free agency).
Anteriormente disponível apenas para estrelas como Charlie Chaplin ou Curt Flood, o trabalho autônomo e outras relações de trabalho mais auto-organizadas são cada vez mais populares*. Cada downsizing corporativo, cada terceirização off-shore e cada ciclo recessivo ensina mais pessoas a serem free agents.
O desafio do mercado de capital intelectual é ainda maior.
Um ativo como nenhum outro
A informação tem características econômicas únicas: ela pode ser compartilhada a custo marginal muito baixo e, muitas vezes, reduzir sua escassez aumenta seu valor.
Quanto mais pessoas usam a AOL, mais conteúdo se torna disponível para usuários do AOL. Distribuir enormes quantidades de CDs do AOL não é equivalente a dar aparelhos de barbear, para poder vender as lâminas. Como muitos usuários vão ao AOL para conhecer outras pessoas, é como se distribuir aparelhos de barbear gratuitos tornasse as lâminas melhores.
Seth Godin, autor de Marketing Viral, ofereceu seus livros gratuitamente na Web – tornando seu conteúdo não-escasso – e, em seguida, publicou e vendeu o mesmo conteúdo, na forma de livros, a US$ 40. Ele ilustrou uma idéia-chave do marketing de capital intelectual: “você o distribui gratuitamente, até começar a cobrar por ele”.
Arquipélago em conflito
Criar, remunerar, distribuir e precificar a informação é o hotspot tectônico da nossa atual fase de evolução econômica. A placa do “continente” industrial vai mergulhando sob a “placa continental” da emergente economia da informação. Já podemos ver um arquipélago, formado por ilhas de inovação, muitas vezes marcadas por conflitos. Por exemplo:
- No mundo do entretenimento, a exploração da economia da informação, pela Napster, entrou em conflito com modelos de precificação da era industrial, como se o valor estivesse no CD, não no conteúdo. Um novo campo do direito, “Propriedade Intelectual Digital”, surgiu para ajudar (talvez) a lidar com estas questões, na indústria de mídia e outras formas de propriedades intelectuais.
- Os primeiros sequenciamentos do genoma humano provocaram uma batalha entre a Celera – que ambicionava tornar-se proprietária da informação – e programas de pesquisa patrocinados pelo governo, que tornaram essa propriedade intelectual gratuita.
- O MIT disponibilizou gratuitamente seus materiais de cursos, na Internet.
- O Creative Commons, uma “organização sem fins lucrativos, que trabalha para restabelecer o equilíbrio entre o ganho público e privado, no controle e uso do produto do trabalho criativo”, foi lançado em 2002, em parte para confrontar a tentativa dos donos de patentes e copyrights, de estender indefinidamente o prazo dessa propriedade. O Creative Commons definiu licenças com “alguns direitos reservados” para criadores de propriedade intelectual que contribuam para o Commons – é o equivalente ao programa de fonte aberta, no campo das artes.
- O iTunes, loja de música online da Apple, foi bem sucedida redefinindo “propriedade” da música como o direito de copiá-lo para um número ilimitado de CDs e cinco computadores. Esta é uma versão do programa de fonte aberta, para a música.
- A Sun Microsystems e outros investidores da linguagem Java, criaram o Fundo Java, para investir em startups que utilizassem o Java no desenvolvimento de seus produtos. Seu propósito era acelerar a visibilidade e aceitação do Java como o padrão da indústria. Na verdade, eles estavam abrindo mão da exclusividade na propriedade intelectual, para atrair o capital humano e intelectual necessários ao seu sucesso.
Christopher Meyer
Para saber como esses conflitos deverão afetar nossa vida e nossa sociedade, leia o terceiro e último post A sociedade em que nossos filhos viverão 3.
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* Estes desenvolvimentos são descritos em Free Agent Nation de Dan Pink.